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O Império Greco-Macedônico

Até a ascenção de Filipe II (382 – 336) ao trono em 359 a.C., a Macedônia era uma monarquia constituída por uma nobreza tribal e uma vasta população de camponeses arrendatários livres. Com a unificação das tribos e estados macedônicos através do rei Filipe II, a Macedônia se viu pronta para expandir seus domínios para os terrirórios gregos já debilitados pelas inúmeras guerras entre as poleis. Anexando as minas de ouro da Trácia, possuiu os recursos necessários para sua hegemonia militar e cultural que foi solidificada com Alexandre Magno. A cavalaria, que era até então subordinada aos hoplitas “foi renovada e ligada de maneira mais maleável à infantaria, a qual dispensou parte do armamento pesado hoplita para ganhar mais mobilidade e utilizar mais a lança longa nas batalhas” (ANDERSON, 2016, p. 54). Criando novos cidadãos entre os gregos e os demais habitantes nas regiões conquistadas, urbanizando seu território rural e se aproveitando do melhor da filosofia, governo e cultura proveniente das cidades-estados grega, o governo macedônico se expandiu por toda a Grécia e além, pois quando Alexandre III assumiu o trono, as fronteiras entre o Oriente e o Ocidente foram ultrapassadas. É interessante notar, que alguns gregos perceberam a ameaça macedônica sobre suas cidades como Demóstenes que escreveu discursos contra Filipe II tentando alertar os atenienses: “Na verdade, Filipe não cresceu tanto graças à sua própria força, quanto devido à nossa negligência” [Primeira Filípica (351 a.C.), parágrafos 9-11]. 

Alexandre, o Grande

Alexandre, o Grande (356 – 323) aos 18 anos de idade participou da sua primeira batalha, a de Queroneia em 2 de agosto de 338 a.C, onde as tropas macedônicas esmagaram as tropas gregas de Atenas e Tebas. Dois anos depois, Filipe II seria assasinado e seu filho, Alexandre III conhecido como Alexandre, o Grande, que ascenderia ao trono e sufocaria diversas rebeliões na Trácia, na Tessália e na Liga de Corinto, na qual incendiou Tebas. Unificada, portanto, a Península dos Balcãs, Alexandre partiu para suas campanhas na Ásia Menor que durariam 12 anos. “Os golpes decisivos ocorreram no início derrotando os persas nas batalhas dos rios Granico (334 a.C.), Issos (333 a.C.) e Gaugamelos (331 a.C.) que destruíram a capacidade de resistência do exército”[1] persa aquemênida e finalmente o liquidaram. Depois da vitória, avançou para o Oriente, atravessando o rio Indo em 326 a.C. Mas depois de ums rebelião e insatisfação generalizada no exército já abatido pela fome e condições climáticas, Alexandre é obrigado a retornar para a Babilônia, onde morreu e foi sucedido pelos seus quatro generais. Sobre isso é interessante ver no livro bíblico de Daniel no capítulo 8, vers. 5-8, e 20-22 escrito muito tempo antes:  

E, estando eu considerando, eis que um bode vinha do ocidente sobre toda a terra, mas sem tocar no chão; e aquele bode tinha um chifre insigne entre os olhos. E dirigiu-se ao carneiro que tinha os dois chifres, ao qual eu tinha visto em pé diante do rio, e correu contra ele no ímpeto da sua força. E vi-o chegar perto do carneiro, enfurecido contra ele, e ferindo-o quebrou-lhe os dois chifres, pois não havia força no carneiro para lhe resistir, e o bode o lançou por terra, e o pisou aos pés; não houve quem pudesse livrar o carneiro da sua mão. E o bode se engrandeceu sobremaneira; mas, estando na sua maior força, aquele grande chifre foi quebrado; e no seu lugar subiram outros quatro também insignes, para os quatro ventos do céu. Aquele carneiro que viste com dois chifres são os reis da Média e da Pérsia, Mas o bode peludo é o rei da Grécia; e o grande chifre que tinha entre os olhos é o primeiro rei; O ter sido quebrado, levantando-se quatro em lugar dele, significa que quatro reinos se levantarão da mesma nação, mas não com a força dele.

A Interpretação tradicional dessa passagem é justamente o avanço extremamente rápido e irresistível de Alexandre sobre “toda a terra” onde derruba “os reis da Média e da Pérsia”, mas que todavia “na sua maior força”, isto é, na sua idade de mais vigor, “é quebrado”, referindo-se a morte prematura de Alexandre e que “no seu lugar subiram outros quatro” “mas não com a força dele”, os quais são os generais Casandro, Lisímaco, Ptolomeu I e Seleuco I. 


Embora com um governo de total de apenas 13 anos, Alexandre deixou uma marca na História que nunca mais seria esquecida. Educado por Aristóteles, com o qual as vezes divergia devido ao seu multiculturalismo em contraponto ao ensinamento mais restrito aos gregos de seu tutor, Alexandre não apenas “mundializou” a cultura grega como misturou os costumes locais aos valores gregos. Nesse momento surgem diversas Escolas Filosóficas Helenísticas, a língua grega koiné falada pelos soldados começa a se expandir por todo território do antigo Império Grego junto de suas culturas. A título de comparação podemos ver que Atenas no século V a.C. contava com cerca de 80 mil habitantes, enquanto Alexandria, Selêucia e Antioquia no período helênico devia ter mais de 500 mil habitantes. “Alexandre havia dilapidado o ouro da realeza pérsia, liberando as reservas aquemênidas para o sistema abrupto no volume das transações comerciais no Mediterrâneo” (2016, p. 56). Sendo assim, os contatos entre os povos se acentuou, como também os conflitos que aos poucos foram minando o Império Grego, que agora eram Estados Helênicos com distintas dinastias e governos próprios. Fragmentando o poder, invasões de povos vizinhos começaram a ocorrer e não tardou muito para os romanos, após consolidarem seu poder na “Magna Grécia”, expandirem seus domínios e aproveitarem a fragilidade dos governantes. Todavia, os romanos não alterariam as bases locais econômicas, sociais e culturais dos povos fundadas por Alexandre e seus generais. Portanto, toda a noção de Ocidente que conhecemos hoje tem suas bases helenísticas lançadas pelos “bárbaros” macedônicos que souberam aproveitar o que havia de melhor nos lugares conquistados.

Referências 
ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. Tradução de Renato Prelorentzou. São Paulo: Editora Unesp, 2016. 
DOMINGUES, Joelza Ester. “Alexandre Magno derrota Dario III, o imperador persa”; Blog: Ensinar História. Disponível em: https://ensinarhistoria.com.br/linha-do-tempo/alexandre-magno-derrota-dario-iii/. Acesso em 12 de maio de 2022.  
GUARINELLO, Norberto Luiz. História Antiga. São Paulo: Contexto, 2013.

Notas
[1] Disponível em: https://ensinarhistoria.com.br/linha-do-tempo/alexandre-magno-derrota-dario-iii/.


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