O estudo da História é essencial para entendermos como chegamos até aqui, por que as coisas são o que são, compreender que muitos dos direitos que temos como naturais foram conquistados, forjados e formados pelos homens ao longo da história com muito suor, sangue e lágrimas. A memória, segundo Guarinello (2013: 08), é a grande “fundadora e legitimadora das identidades, porque é ela que define quais são as mais importantes, quais não são fluidas e passageiras e quais são aquelas que adquirimos de nascença, como herança de nossos ancestrais”. “Com efeito, o interesse do passado está em esclarecer o presente; o passado é atingido a partir do presente” (LE GOFF, 1990: 13-14).
Marc Bloch, antigo medievalista francês, afirma que se História não servisse para nenhuma função prática, ela ainda serviria para diversão, todavia, com falta de um sentido teleológico, faltaria algo a lhe legitimar. Não que ela precise de alguém ou de algo para legitimá-la, até mesmo porque sua funcionalidade está bem aparente, embora muitos não percebam. Entretanto, para atuar sobre o mundo atual, devemos entender que ele nem sempre foi como o vemos. Pessoas o transformaram no decorrer do tempo. No mundo atual, mais do que nunca, a História está intrínseca na dialética das identidades individuais e coletivas. Quando pensamos em quem somos, lembramos de quem foram as pessoas antes de nós. Como elas formaram a minha identidade e o que eu quero deixar de legado para as próximas gerações. Nos dias de hoje, a procura pela identidade própria é tão grande que muitos pensam que podem comprá-la num mundo consumista.
Janice Theodoro no livro História na sala de aula critica essa relação:
O homem pode também viajar muito, tirar fotografias, sem ver o mundo. É a cegueira contemporânea. Pode trocar objetos, desenvolver tecnologias e ao mesmo tempo transforma-se em prisioneiro de uma série de objetos totalmente inúteis sem saber bem por que os comprou. Esse homem parece ter desenvolvido tanto a razão mas vive num mundo cada dia mais irracional (2013: 50).
Individualmente as pessoas carecem de entendimento sobre quem elas são e, por isso, procuram no passado as respostas. Coletivamente o mesmo acontece: sociedades e nações precisam encontrar o ponto de convergência de sua identidade enquanto povo. “No mundo contemporâneo, o Estado é o maior e mais eficaz produtor de memórias sociais” (GUARINELLO, 2013: 08). Tanto para coisas boas, como para passar a ideia de unidade nacional e estabelecer vínculos com o patrimônio histórico-cultural, quanto para coisas ruins, como legitimação de preconceitos e fundamentação de desigualdades.
Se a história tornou-se, portanto, um elemento essencial da necessidade de identidade individual e coletiva, logo agora a ciência histórica sofre uma crise (de crescimento?): no diálogo com as outras ciências sociais, no alargamento considerável de seus problemas, métodos, objetos, ela pergunta se não começa a perder-se (LE GOFF, 1990: 16).
O questionamento de Le Goff é válido. Embora a História sirva de forma grandiosa a responder perguntas de nossas identidades, ela não se resume a isso. Ela é uma ciência que visa estudar as ações humanas no decorrer do tempo. Ela trata de memórias sim, mas documentadas de forma textual, imagética, arquitetônica, dentre outras. O Estudo em História não é apenas uma narração cronológica de eventos, mas uma escrita metodológica e crítica dos "homens no tempo". A “História feita por historiadores é a principal fonte de legitimação da memória social porque ela é científica (GUARINELLO, 2013: 08). A memória dos homens é a grande construtora do passado.
Referências
GUARINELLO, Norberto Luiz. História Antiga. São Paulo: Contexto, 2013.
KARNAL, Leandro (org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2009.
LE GOFF, Jacques. História e Memória. São Paulo: UNICAMP, 1990.
Comentários
Postar um comentário