O Positivismo é classificado muitas vezes como uma filosofia apenas, mas pelo que nós vemos nos escritos de Auguste Comte (1798 – 1857): Catecismo Positivista (1852), verificamos que é muito mais do que isso, é um estilo de vida e mentalidade, uma religião cujo deus é o próprio homem, ou como dito por Comte: a “Religião da Humanidade”. Porém, muitos de seus adeptos não gostaram das suas últimas obras e, assim, tomaram como exemplo e norte o Curso de Filosofia Positiva (1830/42) e o Discurso sobre o Espírito Positivo (1844) no qual A.Comte descreve os objetivos do que seria a Filosofia Positiva e como ela poderia transformar a sociedade através da Ordem e do Progresso.
“O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim” foi o principal e fundamental lema filosófico do pensador francês que nasceu e viveu em meio às turbulências da sociedade pós-revolução francesa e durante o governo de Napoleão Bonaparte. Na sua visão, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial trouxeram inúmeros benefícios à sociedade com um todo, principalmente do ponto de vista intelectual. Porém, falhou ao se limitar de sair do estado Teológico – no qual a explicação dos fenômenos é dada a seres sobrenaturais seja através do politeísmo ou do monoteísmo (este para Comte deveria culminar no próximo estágio) – e permanecer no estado Metafísico – o qual seria uma transição para o terceiro estado e suas explicações seriam dadas agora pelas forças abstratas. Seu término seria na exaltação da Natureza.
Com a Natureza em foco, o ser humano deveria passar para o estado Positivo (último e definitivo), neste ele reconheceria a impossibilidade de obter noções absolutas e deveria se preocupar em saber as relações invariáveis de sucessão e de similitude dos fenômenos. Mas, parece que isso ainda não havia ocorrido na sociedade francesa do século XIX. Para isso, o autor defendia uma Lei Natural dos Fenômenos através de uma hierarquização das ciências. Nesta, a física social, posteriormente denominada de Sociologia, seria a mais complexa, particular e concreta ciência. Desse modo, para estudá-la, deveria partir de ciências mais simples, gerais e abstratas, como a Matemática. Essa “pirâmide” dos conhecimentos com a base matemática passaria pela Física, Química, a Biologia e finalmente chegaria aos estudos da sociedade.
Mas o que isso tudo tem a ver com o Brasil? Bom, todos sabem que o lema "Ordem e Progresso" está presente em nossa bandeira. É perceptível que Auguste Comte vê um progresso na sociedade através da Lei dos Três Estados enunciada anteriormente aqui pela “escada” dos estágios: Teológico, Metafísico e Positivo. Para que haja essa “dinâmica” na sociedade, dada através de um progresso evolutivo constante, ela precisa sempre de uma “estática” em cada estágio em que se encontra, dada por uma ordem fixa e exata. Esse equilíbrio entre estática e dinâmica é o que promove, respectivamente, a harmonia e a evolução da sociedade.
Comte, diferente de Karl Marx, não via a sociedade com uma eterna luta de classes. Para ele, qualquer desentendimento e luta seria resolvida pela Filosofia Positiva. E esta, por sua vez, geraria uma conciliação entre proletários e industriais. É interessante destacar que o autor via na sociedade três ordens distintas: a de artistas, engenheiros e cientistas, algo pouco desenvolvido pelos livros. Os Engenheiros organizariam as relações entre a teoria (Ciência) e a prática (Arte). Para o autor “toda ciência [consequentemente toda sociedade, pois Comte previa uma sociedade científica] pode ser exposta mediante dois caminhos”: o caminho histórico e o caminho dogmático. O primeiro procedimento seria uma exposição sucessiva dos conhecimentos na mesma ordem efetiva e o segundo seria uma apresentação do sistema de ideias tal como poderia ser concebido hoje por um único espírito. “Em resumo, ciência, daí previdência; previdência, daí ação”. Uma ciência para ser aceita deveria passar inquestionavelmente pela experiência, sendo este o único meio dela ser aceita.
Esses modos de interpretação da sociedade seriam característicos para o desenvolvimento da sociologia enquanto ciência. A Ordem e Progresso é um modo de organização da sociedade, pois o próprio autor defende que o objetivo final do Positivismo seria sua reestruturação e a reorganização dela, colocando como inquestionável o motivo de todo desenvolvimento que se poderia atingir socialmente através da ciência.
Quando
proclamada a República no dia 15 de Novembro de 1889, nós tivemos (como ausência
de símbolos da nova forma de governo instaurada) entoado o Hino Nacional da
França, que não por acaso é o berço da Revolução Francesa, que, como já vimos, influenciou extremamente os trabalhos de Comte, e hasteada uma bandeira improvisada muito
similar a dos Estados Unidos da América, que era republicano e muito
tecnicista. Um dos "medos" dos republicanos da época, era, como diz
Comte em seu Curso de Filosofia Positiva, não serem os "homens que estão
ao nível de seu século". Tinham medo de serem considerados "atrasados",
de perderem privilégios. A República não foi um movimento popular, por isso era
necessária a Ordem: o decreto de Deodoro afirmava que o povo deveria ser
consultado quanto a forma de governo, porém, isso só foi feito mais de 100 anos
depois. Retiraram a cruz estampada na bandeira monárquica e colocaram no lugar
um lema positivista; já que para Comte o estado teológico é o mais
"primitivo" e a ciência - que possui paradigmas que estão em constante mudança - deveria reinar. Bom, Viva a República!
"Deus que me conceda estes desejos: paz e prosperidade para o Brasil" - Dom Pedro II
Apêndice
O historiador João Camilo de Oliveira Torres, em seu livro O Positivismo no Brasil, descreve algumas áreas da sociedade brasileira influenciada pela Filosofia Positiva. Uma que eu gostaria de destacar é a educação. Benjamim Constant foi Ministro da Instrução (o que corresponde hoje ao Ministro da Educação) e professor da Escola Militar, e por ser forte defensor do Positivismo, colocou muitos aspectos da filosofia de Comte no meio acadêmico. Embora não possamos traçar contornos definidos à influência positivista na educação brasileira, pois ela foi feita de forma indireta, podemos dizer que a “mentalidade brasileira em relação aos assuntos educacionais foi até muito pouco tempo nitidamente positivista.” Um exemplo foi a preponderância do pragmatismo e a posição de inteligência em face dos problemas suscitados pela realidade educacional.
Auguste Comte elaborou a sua classificação das ciências, tendo como objetivo a atividade útil sobre o mundo. Ciência seria aquela que pudesse ser controlada pela matemática, tendo esta como sua base; depois de registrados os fatos pela experiência, e “tivesse um interesse social demonstrado”, como disse Raimundo Teixeira Mendes filósofo e matemático brasileiro, autor da bandeira nacional republicana. Assim, nossa educação foi marcada por esse cientificismo técnico e muitas vezes por esse espírito antimetafísico presente em nossos livros até hoje.
Em
suma: o positivismo possui raízes bem profundas no Brasil e influenciou em muito
toda a história de nossa nação até os dias atuais, estando sua defesa nas
mídias de uma forma muito contundente com uma idolatria pela "ciência". Estejamos atentos, pois o próprio Auguste Comte viveu
uma vida bastante solitária.
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